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Os Índices de Atualização Aplicáveis na Justiça do Trabalho

Os Índices de Atualização Aplicáveis na Justiça do Trabalho

 

Com é cediço, no âmbito da Justiça do Trabalho há diversas peculiaridades quanto à liquidação das sentenças de mérito, e, por muito tempo, houve grande celeuma em tanto em relação ao dies a quo para se estabelecer a aplicação dos índices de atualização, quanto em relação a qual dos índices seriam cabíveis, inclusive, em relação às fases pré-processual e processual, durante o processo de conhecimento ou na fase executória.

 

Essa turbulência gerada em torno da atualização das sentenças de mérito acabou por gerar o elastecimento dos executivos trabalhistas, ao ponto de acabar prejudicando a razoável duração do processo e a celeridade da sua tramitação, direito fundamental, conforme o artigo 5º, inciso LXXVIII da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

 

Decerto, a vagarosidade na tramitação dos executivos trabalhistas teve como um de seus fatores determinantes a divergência entre as planilhas de liquidação apresentadas pelas partes litigantes, além das discrepâncias muitas vezes apuradas pelo setor de Contadoria Judicial, em grande parte justamente por não haver consenso quanto aos critérios de aplicação dos juros moratórios e dos índices de correção monetária utilizados.

 

Recentemente houve fixação de entendimento pelo Egrégio Supremo Tribunal Federal quanto a esses aspectos a Ação Declaratória de Constitucionalidade nº. 058, acerca dos índices de correção monetária e juros.

 

Segue a transcrição da ementa do referido julgado:

 

EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO DO TRABALHO. AÇÕES DIRETAS DE INCONSTITUCIONALIDADE E AÇÕES DECLARATÓRIAS DE CONSTITUCIONALIDADE. ÍNDICES DE CORREÇÃO DOS DEPÓSITOS RECURSAIS E DOS DÉBITOS JUDICIAIS NA JUSTIÇA DO TRABALHO. ART. 879, §7º, E ART. 899, §4º, DA CLT, NA REDAÇÃO DADA PELA LEI 13. 467, DE 2017. ART. 39, CAPUT E §1º, DA LEI 8.177 DE 1991. POLÍTICA DE CORREÇÃO MONETÁRIA E TABELAMENTO DE JUROS. INSTITUCIONALIZAÇÃO DA TAXA REFERENCIAL (TR) COMO POLÍTICA DE DESINDEXAÇÃO DA ECONOMIA. TR COMO ÍNDICE DE CORREÇÃO MONETÁRIA. INCONSTITUCIONALIDADE. PRECEDENTES DO STF. APELO AO LEGISLADOR. AÇÕES DIRETAS DE INCONSTITUCIONALIDADE E AÇÕES DECLARATÓRIAS DE CONSTITUCIONALIDADE JULGADAS PARCIALMENTE PROCEDENTES, PARA CONFERIR INTERPRETAÇÃO CONFORME À CONSTITUIÇÃO AO ART. 879, §7º, E AO ART. 899, §4º, DA CLT, NA REDAÇÃO DADA PELA LEI 13.467, DE 2017. MODULAÇÃO DE EFEITOS.

  1. A exigência quanto à configuração de controvérsia judicial ou de controvérsia jurídica para conhecimento das Ações Declaratórias de Constitucionalidade (ADC) associa-se não só à ameaça ao princípio da presunção de constitucionalidade – esta independe de um número quantitativamente relevante de decisões de um e de outro lado –, mas também, e sobretudo, à invalidação prévia de uma decisão tomada por segmentos expressivos do modelo representativo. 2. O Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade do art. 1º-F da Lei 9.494/1997, com a redação dada pela Lei 11.960/2009, decidindo que a TR seria insuficiente para a atualização monetária das dívidas do Poder Público, pois sua utilização violaria o direito de propriedade. Em relação aos débitos de natureza tributária, a quantificação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança foi reputada ofensiva à isonomia, pela discriminação em detrimento da parte processual privada (ADI 4.357, ADI 4.425, ADI 5.348 e RE 870.947-RG – tema 810). 3. A indevida utilização do IPCA-E pela jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho (TST) tornou-se confusa ao ponto de se imaginar que, diante da inaplicabilidade da TR, o uso daquele índice seria a única consequência possível. A solução da Corte Superior Trabalhista, todavia, lastreia-se em uma indevida equiparação da natureza do crédito trabalhista com o crédito assumido em face da Fazenda Pública, o qual está submetido a regime jurídico próprio da Lei 9.494/1997, com as alterações promovidas pela Lei 11.960/2009. 4. A aplicação da TR na Justiça do Trabalho demanda análise específica, a partir das normas em vigor para a relação trabalhista. A partir da análise das repercussões econômicas da aplicação da lei, verifica-se que a TR se mostra inadequada, pelo menos no contexto da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT), como índice de atualização dos débitos trabalhistas. 5. Confere-se interpretação conforme à Constituição ao art. 879, §7º, e ao art. 899, §4º, da CLT, na redação dada pela Lei 13.467, de 2017, definindo-se que, até que sobrevenha solução legislativa, deverão ser aplicados à atualização dos créditos decorrentes de condenação judicial e à correção dos depósitos recursais em contas judiciais na Justiça do Trabalho os mesmos índices de correção monetária e de juros vigentes para as hipóteses de condenações cíveis em geral (art. 406 do Código Civil), à exceção das dívidas da Fazenda Pública que possui regramento específico (art. 1º-F da Lei 9.494/1997, com a redação dada pela Lei 11.960/2009), com a exegese conferida por esta Corte na ADI 4.357, ADI 4.425, ADI 5.348 e no RE 870.947-RG (tema 810). 6. Em relação à fase extrajudicial, ou seja, a que antecede o ajuizamento das ações trabalhistas, deverá ser utilizado como indexador o IPCA-E acumulado no período de janeiro a dezembro de 2000. A partir de janeiro de 2001, deverá ser utilizado o IPCA-E mensal (IPCA-15/IBGE), em razão da extinção da UFIR como indexador, nos termos do art. 29, § 3º, da MP 1.973-67/2000. Além da indexação, serão aplicados os juros legais (art. 39, caput, da Lei 8.177, de 1991). 7. Em relação à fase judicial, a atualização dos débitos judiciais deve ser efetuada pela taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e Custódia – SELIC, considerando que ela incide como juros moratórios dos tributos federais (arts. 13 da Lei 9.065/95; 84 da Lei 8.981/95; 39, § 4º, da Lei 9.250/95; 61, § 3º, da Lei 9.430/96; e 30 da Lei 10.522/02). A incidência de juros moratórios com base na variação da taxa SELIC não pode ser cumulada com a aplicação de outros índices de atualização monetária, cumulação que representaria bis in idem. 8. A fim de garantir segurança jurídica e isonomia na aplicação do novo entendimento, fixam-se os seguintes marcos para modulação dos efeitos da decisão: ( i) são reputados válidos e não ensejarão qualquer rediscussão, em ação em curso ou em nova demanda, incluindo ação rescisória, todos os pagamentos realizados utilizando a TR (IPCA-E ou qualquer outro índice), no tempo e modo oportunos (de forma extrajudicial ou judicial, inclusive depósitos judiciais) e os juros de mora de 1% ao mês, assim como devem ser mantidas e executadas as sentenças transitadas em julgado que expressamente adotaram, na sua fundamentação ou no dispositivo, a TR (ou o IPCA-E) e os juros de mora de 1% ao mês; (ii) os processos em curso que estejam sobrestados na fase de conhecimento, independentemente de estarem com ou sem sentença, inclusive na fase recursal, devem ter aplicação, de forma retroativa, da taxa Selic (juros e correção monetária), sob pena de alegação futura de inexigibilidade de título judicial fundado em interpretação contrária ao posicionamento do STF (art. 525, §§ 12 e 14, ou art. 535, §§ 5º e 7º, do CPC. 9. Os parâmetros fixados neste julgamento aplicam-se aos processos, ainda que transitados em julgado, em que a sentença não tenha consignado manifestação expressa quanto aos índices de correção monetária e taxa de juros (omissão expressa ou simples consideração de seguir os critérios legais). 10. Ação Declaratória de Constitucionalidade e Ações Diretas de Inconstitucionalidade julgadas parcialmente procedentes.

 

Ao decidir sobre a modulação dos efeitos da decisão, assim se manifestou o Pretório Excelso:

 

(i) são reputados válidos e não ensejarão qualquer rediscussão (na ação em curso ou em nova demanda, incluindo ação rescisória) todos os pagamentos realizados utilizando a TR (IPCA-E ou qualquer outro índice), no tempo e modo oportunos (de forma extrajudicial ou judicial, inclusive depósitos judiciais) e os juros de mora de 1% ao mês, assim como devem ser mantidas e executadas as sentenças transitadas em julgado que expressamente adotaram, na sua fundamentação ou no dispositivo, a TR (ou o IPCA-E) e os juros de mora de 1% ao mês; (ii) os processos em curso que estejam sobrestados na fase de conhecimento (independentemente de estarem com ou sem sentença, inclusive na fase recursal) devem ter aplicação, de forma retroativa, da taxa Selic (juros e correção monetária), sob pena de alegação futura de inexigibilidade de título judicial fundado em interpretação contrária ao posicionamento do STF (art. 525, §§ 12 e 14, ou art. 535, §§ 5º e 7º, do CPC) e (iii) igualmente, ao acórdão formalizado pelo Supremo sobre a questão dever-se-á aplicar eficácia erga omnes e efeito vinculante, no sentido de atingir aqueles feitos já transitados em julgado desde que sem qualquer manifestação expressa quanto aos índices de correção monetária e taxa de juros (omissão expressa ou simples consideração de seguir os critérios legais), vencidos os Ministros Alexandre de Moraes e Marco Aurélio, que não modulavam os efeitos da decisão.

 

 

O entendimento acima fora estabelecido igualmente na ADC 59 e ADIs 5867 e 6021.

 

Nesse particular, interpretando o que restou decidido no julgado da Suprema Corte, no bojo da ADC 058, o Ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho, do Tribunal Superior do Trabalho, nos autos do processo nº. 102966-41.2017.5.01.0471, em decisão proferida no dia 30 de março de 2021, explicou todas as hipóteses de aplicação da ADC 058, a saber:

 

“1) débitos trabalhistas judiciais ou extrajudiciais já pagos – serão mantidos os critérios com os quais foram pagos (TR ou IPCA-E+ juros de 1% ao mês);

 

2) processos transitados em julgado COM definição dos critérios de juros e correção monetária – observar-se-ão esses critérios (TR ou IPCA-E + juros de 1% ao mês);

 

3) processos transitados em julgado SEM definição dos critérios de juros e correção monetária – atualização e juros pela Taxa Selic (que já engloba os dois fatores);

 

4) processos em curso – IPCA-E + juros equivalentes à TR acumulada (Lei 8.177/91, art. 39) para o período pré-processual, e Taxa Selic (englobando juros e correção monetária) para o período processual.”[1]

 

Nesse sentido, a fixação dos novos critérios de atualização passam necessariamente pela análise da satisfação ou não do crédito, e do trânsito em julgado da decisão.

Quanto à satisfação do crédito não há qualquer dificuldade de aplicação prática, já que o que buscou proteger o legislador foi o princípio da segurança jurídica, em relação às obrigações já cumpridas segundo às regras vigentes na época de seu adimplemento.

 

Todavia, o mesmo não se pode dizer em relação ao trânsito em julgado, principalmente porque o trânsito em julgado pode ser operado em tempos diferentes dentro do processo, a depender dos capítulos da sentença que forem questionados no segundo grau de jurisdição.

 

À guisa de exemplificação, em situação hipotética, mesmo que o trânsito em julgado de uma sentença tenha sido certificado após a decisão proferida no ADC 058, caso a matéria acerca do índice de correção monetária não tem constituído o objeto do recurso, o transitado em julgado em relação a esta já se operou o trânsito em julgado desde o transcurso do prazo para a interposição do recurso, haja visto que, não suscitada nas razões do recurso.

 

Por fim, a incidência dos juros se dá após o cômputo da correção monetária, conforme a Súmula 200 do Tribunal Superior do Trabalho:

 

JUROS DE MORA. INCIDÊNCIA (mantida) – Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003.

Os juros de mora incidem sobre a importância da condenação já corrigida monetariamente.

 

Desse modo, a partir desse novo entendimento do Supremo Tribunal Federal, até que haja disciplina por meio de lei editada pelo Congresso Nacional acerca do tema, o tema da atualização das sentenças trabalhistas seguirá a regulamentação proposta pelo Supremo de forma homogênea, respeitados as balizas da modulação dos efeitos do decisum.

 

 

[1]PROCESSO Nº TST-RRAg-102966-41.2017.5.01.0471

 

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